sexta-feira, 24 de julho de 2009

Transferência legal e Ilegal: O limite do poder Discricionário

Todo ato administrativo deve ser pautado na lei, e uma vez realizado fora desta seara, gera invalidade. Apesar da transferência ser um ato discricionário que depende da conveniência e oportunidade da administração, não deve ser confundido com ato arbitrário, como ocorre muitas vezes, pois geralmente não há uma motivação que fundamente. Certos, "considerando" das portarias não são motivações suficientes para a transferência e muito menos tem relação com conveniência e oportunidade.
Helly Lopes Meirelles, emérito doutrinador na esfera de direito administrativo, conceitua que:

“Discrição é liberdade de ação dentro dos limites legais; arbítrio é ação contrária ou excedente da lei. Ato discricionário, portanto, quando permitido pelo direito é legal e válido; ato arbitrário é, sempre e sempre, ilegítimo e inválido.”

Claro que não compete ao judiciário determinar a conveniência e oportunidade dos atos discricionários da administração pública, mas não pode ficar alheio quando a discricionariedade é fora da lei, visto ser sempre relativa e parcial quanto à competência, forma, motivo, objeto e à finalidade que é o interesse público. Quando o ato contraria esses preceitos, torna-se ilegítimo e nulo, conforme Helly Lopes Meirelles:

“O ato discricionário praticado por autoridade incompetente, ou realizado por forma diversa da prescrita em lei, ou informado de finalidade estranha ao interesse público, é ilegítimo e nulo. Em tal circunstância, deixaria de ser ato discricionário para ato arbitrário – ilegal, portanto.” (Direito Administrativo Brasileiro, 29ª Ed.)
Quando o fundamento não diz respeito ao interesse público, no máximo, podemos levar em consideração o interesse privado das partes envolvidas, no caso, do próprio servidor público. Não obstante que a motivação de necessidade é facilmente afastada, quando há apenas uma permuta de servidores, como por exemplo, um que está na sede vem para o distrito e outro que estava no distrito vai para sede, tornando o ato eivado de nulidade que pode ser declarada e reconhecida pelo Poder Judiciário. Prossegue o emérito doutrinador:

“O bem comum, identificado com o interesse social ou interesse coletivo, impõe que toda atividade administrativa lhe seja endereçada. Fixa, assim, o rumo que o ato administrativo deve procurar. Se o administrador se desviar desse roteiro, praticando ato que, embora discricionário, busque outro objetivo, incidirá em ilegalidade, por desvio de poder ou de finalidade, que poderá ser reconhecido e declarado pela própria Administração ou pelo Poder Judiciário.”
(Direito Administrativo Brasileiro, 29ª Ed.)
O principio da finalidade, é a mola mestra do ato discricionário, demonstrando que o ato deve ser favorável ao interesse público, dispondo Helly Lopes Meirelles:

“O que o principio da finalidade veda é a prática de ato administrativo sem interesse público ou conveniência para a administração, visando unicamente a satisfazer interesses privados, por favoritismo ou perseguição dos agentes governamentais, sob a forma de desvio de finalidade.”

Não bastasse o desvio de finalidade e a falta de interesse público, muitas vezes o servidor exerce durante muitos anos a sua função naquele local, sendo mais um agravante, que gera inclusive o direito a permanência no mesmo, conforme o princípio da Segurança Jurídica, defendido pelo Supremo Tribunal Federal – STF:

“Essencialidade do postulado da segurança jurídica e a necessidade de se respeitar situações consolidadas no tempo, amparadas pela boa-fé do cidadão (seja ele servidor público ou não), representam fatores que o judiciário não pode ficar alheio.”

O que o município perde com a permanência desse servidor nesse local? Como pode a própria administração pública reconhecer muitas vezes a competência desse servidor e transferi-lo para outro desmotivando-o? Quebrar um vínculo estabelecido com a comunidade é de interesse público?
A Constituição Federal em seu artigo 37, caput, prevê:

“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da LEGALIDADE, IMPESSOALIDADE, MORALIDADE, PUBLICIDADE E EFICIÊNCIA....”
Além da violação aos princípios da finalidade (impessoalidade) e Segurança Jurídica, percebe-se que outros norteadores da Constituição Federal e da boa administração são violados. Afronta flagrante inicia-se na própria lei orgânica do município que veda a transferência, violando um princípio corolário, qual seja, o da legalidade. Define Helly Lopes Meirelles:

“LEGALIDADE, como princípio da Administração significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeita aos MANDAMENTOS DA LEI E ÀS EXIGÊNCIAS DO BEM COMUM, e deles não podendo se afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade DISCIPLINAR, CIVIL E CRIMINAL, conforme o caso.... No Direito Público o que há de menos relevante é a vontade do administrador. Seus desejos, suas ambições, seus programas, seus atos, não têm eficácia administrativa, nem validade jurídica, se não estiverem alicerçados no Direito e na Lei. Não é a chancela da autoridade que valida o ato e o torna respeitável e obrigatório. É A LEGALIDADE A PEDRA DE TOQUE DE TODO ATO ADMINISTRATIVO.”

Basta violar um dispositivo legal, para que acarrete na violação ao PRINCÍPIO DA LEGALIDADE, pois o administrador público, está sujeito aos mandamentos da lei e as exigências do bem comum, que através de uma transferência ilegal, contraria todos esses preceitos.
A moralidade administrativa é atacada quando um ato é praticado fora da lei. Nada mais imoral do que uma transferência unilateral sem interesse para o servidor, nada mais imoral do que violar o real interesse púbico, IMORAL É PRATICAR ATO ADMINISTRATIVO QUE NÃO TRÁS VANTAGEM ALGUMA PARA O MUNICÍPIO E MUITO MENOS PARA A COLETIVIDADE.
Sem falar, que muitas vezes essas portarias de tranferência não são sequer publicadas, violando o princípio da PUBLICIDADE e o da EFICIÊNCIA quando desmotiva esse servidor:
“O que se impõe a todo agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros”
Assim verifica-se que essas transferências ilegais violam o PRINCÍPIO DA LEGALIDADE, MORALIDADE, PUBLICIDADE, FINALIDADE (IMPESSOALIDADE), EFICIÊNCIA E SEGURANÇA JURÍDICA, tornando o ato totalmente nulo e ilegal que deve ser imediatamente corrigido pela via judiciária para que não sejam causados mais prejuízos para o servidor vitimado e para a coletividade, somente quando a transferência é em prol do interesse público é que deve-se tolerar o ato praticado.
É inadmíssivel que um contratado temporário que votou no prefeito assuma a função em um local onde o servidor efetivo já encontrava-se há muitos anos, sendo colocado muitas vezes no último distrito do município sem direito sequer a um vale transporte, passando a pagar para trabalhar, mas isso é um assunto de outro artigo.
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Fridtjof Alves.